quarta-feira, 11 de junho de 2008

Crítica de cinema: "Sin City" (2005)

Oi, pessoal! Sou a mais recente membro da equipa do blog e estou encarregada de vos sugerir o que ver, que filmes alugar ou se vale a pena sair de casa para ir ao cinema - como tal, escolhi um dos meus filmes preferidos dos últimos anos para estrear. Espero que gostem.

Sugestão do fim-de-semana: uma visitinha ao clube de vídeo…
“Sin City”, de Robert Rodriguez & Frank Miller, 2005: com Bruce Willis, Clive Owen, Mickey Rourke, Jessica Alba, Benicio del Toro, Elijah Wood, Rosario Dawson



“Comic-book geeks” irão reconhecer, quanto muito por título apenas, o afamado “romance gráfico” de Frank Miller “Sin City”, uma ode persistentemente bicromática ao espírito “noir” dos filmes de “suspense” a preto e branco, moralmente ambíguos e carregados de estilização dos anos 40 e 50; a “graphic novel” de culto foi, em 2005, trazida até o grande écran pelo professo admirador do trabalho de Miller e jovem realizador Robert Rodriguez, um mestre do retorcido cinematográfico de gosto na era dourada do “gore” realístico que permite a cineastas de outra forma talentosos como Eli Roth terem sucesso por filmes doentios como “Hostel”, ou que faz de “Saw” e das suas múltiplas sequelas êxitos de bilheteiras entre rapazolas de 12 anos. Em detrimento do bom carácter de Rodriguez – que, na minha opinião, não está em causa – o material original não era pêra doce também: Miller vê um mundo a preto, branco, e vermelho-sangue de corrupção, violência, morte, traição, insegurança, ódio – humanidade na sua vertente mais animalesca – que se desenrola abertamente na fictícia Basin City mas que poderia tomar lugar, de forma ligeiramente mais encoberta, em qualquer outra grande cidade dos EUA ou de qualquer outro país industrializado. O título da colectânea dos vários capítulos desta obra de banda desenhada, publicada em almanaques de 1991 a 1992, resume bem o mundo de Sin City: “Booze, Broads and Bullets”: “bebida, gajas e balas”. Os homens são assassinos contratados, “serial killers”, gangsters, políticos ou cléricos corruptos e distorcidos, feios, musculados, armados e cicatrizados: as mulheres são “vixens” sensuais e perigosas, prostitutas ou matadoras treinadas que vestem cabedal e sabem fazer doer. Diz-se que em “Sin City”, o leitor não julga a moralidade do personagem pelo facto de ele torturar e matar pessoas ou não, mas sim pelas pessoas que ele tortura e pelos motivos porque o faz. Estão a ver a imagem.

A história do filme divide-se em três diferentes vertentes, a saga de três diferentes grupos de personagens: a história principal, “Aquele Sacana Amarelo”, revolve em volta do personagem interpretado por Bruce Willis, o último polícia honesto de Basin City, e da sua luta para salvar uma menina das garras de um predador sexual psicopata, indo contra o poder político da cidade que se une para ilibar o violador e condenar o polícia. Mickey Rourke está irreconhecível em “O Duro Adeus”, como um ex-condenado de bom coração mas de péssima imagem, que jura vingar a morte misteriosa de uma prostituta que amou e que foi assassinada debaixo do seu nariz. Finalmente, “A Grande Matança” conta a história de uma guerra urbana que nasce no bairro das prostitutas de Basin City, o bairro mais seguro da cidade, quando a intromissão da polícia, violenta e corrupta, se faz sentir.

O principal a saber acerca de “Sin City” é que é um filme visualmente avassalador: amantes da fotografia cinematográfica, têm o dever de ver este filme. Tal como o romance gráfico, o filme é a preto e branco com ocasionais objectos coloridos para lhes emprestar um ênfase especial – o exagero burlesco nos efeitos especiais, o esfumado dos “backgrounds”, as suas características quase que de fachada, de cenário de banda desenhada, mas que ao mesmo tempo se infiltram perfeitamente no espírito de Basin City como uma cidade real, num mundo diferente mas perturbadoramente familiar, remete-nos não só para o material de origem e para os filmes “noir” nos quais se inspira mas também para um lugar mental marcado pelo “glamour” do perigo e da presença contínua da morte nas sinuosas e escuras ruas da Cidade do Pecado que insere o espectador imediatamente no mundo de Sin City. Por exemplo, a primeiríssima cena do filme, um one-shot entre as misteriosas personagens de Josh Hartnett e Marley Shelton, é, a meu ver, uma das mais esteticamente belas cenas alguma vez filmadas, no topo de um prédio com Basin City iluminada à noite como pano de fundo, o único elemento colorido da cena sendo o vestido de Shelton, vermelho-sague. Mas não é só o aspecto a razão pela qual “Sin City” deve estar nas vossas listas de filmes para ver num futuro mais próximo: as representações são topo de gama, como se poderia esperar do elenco de luxo, embora não sendo realísticas: os actores reconhecem que estão num filme de banda desenhada – ao contrário de, digamos, o franchise Spider Man, no qual a presença de um ser sobre-humano que salta de parede em parede na cidade é, ultimamente, encarada com toda a naturalidade do mundo pelas restantes personagens - mas sem o dar a entender continuamente à audiência; estes actores entram na pele dos personagens e recitam as falas directamente dos balõezinhos de discurso da banda desenhada sem que pareça fora do lugar ou pouco natural. Bruce Willis cai ainda nos seus próprios velhos tiques patenteados, mas, por exemplo, fãs do “Senhor dos Anéis” nunca mais vão olhar para Elijah Wood com os mesmos olhos; e, é claro, há a Jessica Alba, que sem dúvida atrairá muitos espectadores do sexo masculino.

Em suma: “Sin City” é uma aventura cinematográfica inacreditável, memorável e divertida ao mesmo tempo, completamente acessível ao espectador que não conhece a obra original (é claro que todos os dados, como o significado da personagem de Josh Hartnett e a sucessão das histórias no tempo, não são apresentados de bandeja, mas com um mínimo de raciocínio toda a gente chegará lá) e, ao mesmo tempo, consegue ter uma fidelidade tal ao romance gráfico de Miller (não fosse ele o co-realizador de Rodriguez!) que o filme é, basicamente, as vinhetas da banda desenhada interpretadas por actores que muito se parecem – naturalmente ou por via de caracterização, com os desenhos originais. É claro que não é um filme para meninos pequeninos, dado que a contagem de corpos pelo final do filme já ultrapassa os dedos das duas mãos e que o filme trata de temas pesados como a tortura, homicídio, violação, canibalismo, prostituição, enfim – no entanto, é preciso notar que as cenas de tortura estão reduzidas a um mínimo necessário à progressão da história, não há cenas de sexo explícito e mesmo a violência, como tudo o resto, é tratada maioritariamente da mesma forma que é tratada numa banda desenhada – caricatamente e absurdamente exagerada, do género que se poderia encontrar, digamos, em filmes de acção japoneses ou nos dois volumes de “Kill Bill” (de facto, o realizador de “Kill Bill”, o afamado Quentin Tarantino, é amigo pessoal de Robert Rodriguez e realizou um segmento do filme envolvendo Clive Owen e Benicio del Toro, que, a meu ver, é tão absurdo como genial e serve de perfeita amostra do espírito de “Sin City”). Este é, portanto, um dos meus filmes preferidos dos últimos anos e tem, obviamente, o meu selo de aprovação.

1 comentário:

Loot disse...

Eu gostei do filme, mas não sei se ajudou o facto de se colar demasiado à BD. De resto estéticamente está uma experiência muito boa, como ler BD na grande tela e o Mickey Rourke está igual ao Marv.